domingo, 13 de novembro de 2022

CERTEZA

Tenho sonhos...

Sou feito de sonhos.

Dê o nome que quiser.

Ao fechar meus olhos para sempre,

Os sonhos não são mais meus.

Mas hoje…

hoje quero a sonolência das palavras

para viver meus sonhos...


Phonteboa

A poesia é livre.

Poesia não se explica, sente-se! 

Um poema como modo de expressão permite que o poeta manifesta sentimentos ou mesmo emoções de forma lírica ou de modo inusitado. E para tanto ele - o poeta - encontra o seu jeito ou o seu estilo de dizer este sentimento ou esta emoção. E quase sempre ele - o poeta - o faz de modo misterioso, camuflado e criam situações incomuns, misteriosas que deixa o leitor desconcertado. Tira o leitor do "lugar comum" e o move para um estado de pensamento, ou imaginação a que chamamos de "encantamento". Este "encantamento poético" não é o objetivo final do poeta, mas geralmente é a forma que o poema e a poesia encontra o seu alvo. Por isso não dá para explicar a poesia. Podemos até fazer a análise estrutural de um poema, mas é só. Este é o limite. A poesia não. É inexplicável. 

Outro aspecto interessante é a forma como o poeta manifesta sua poesia. Alguns preferem utilizar-se de estrofes, rimas e ritmos, outros, já de forma mais livre, jogam com as palavras, e outros manuseiam ideias de forma tão inusitadas que promovem ou forçam os leitores a interromper a leitura do poema antes mesmo de se chegar ao fim. Por isso a leitura ou saborear - pois para mim, poema não se lê, saboreia-se - exige do leitor treino, dedicação, e principalmente um estado de espírito aberto o suficiente para captar a poesia do poema e a poesia do poeta. É a poesia que quer comunicar-se. E, dentro da minha perspectiva, o leitor deve ser também um poeta, não um poeta que escreve, mas um poeta que Lê, que se encanta, que degusta, que está aberto à poesia. Nesta perspectiva a poesia não pertence ao poeta, não está presa no poema, e não pertence ao leitor, a poesia é espirito livre que circula e que comunica sentimentos, emoções, desejos, sonhos...  

Para exemplificar escolhi dois poemas, de dois poetas incríveis e que muitos não tiveram a sorte de conhecê-los para apresentar aqui. Embora eu seja encantado com a poesia de Manoel de Barros, tenho a janela aberta para outros encantamentos.

DESEJO

Perdi de vista meu olhar
na eternitude de uma saudade...
um amor que virou sopro,
uma vontade que bebeu em delírio,
um querer que se mostrou pouco. 

Deixei perdidos em algumas curvas
planos alucinados de um ser potente,
que repousam ainda sob tênue luzes,
que resistem discretas
aos sono que a noite traz.

Mendigos das madrugadas,
apenas esperando seu tempo passar.
Ansiando por um envelhecer enfim,
um beijo mágico com a abstração
da juventude infinita.

Então a paz derradeira!
o repouso merecido
no lar da completude,
sobe o travesseiro daqueles que,
finalmente, já nada tem mais a desejar.

Este poema de Pedro Nilo, poeta itaunense, é exemplar, pois ao utilizar a "eternitude de uma saudade..." onde ele "perdeu seu olhar", ou no "amor que virou sopro", ou ainda na "vontade que bebeu um delírio", permite ao leitor poetizar sua imaginação e convida ao leitor a abrir-se para a poesia. E é disso que estou querendo falar, como a poesia é capaz de ser livre e de nos libertar... 

Quanto ao resto do poema, deixo para você, leitor.

Mas vamos ao segundo poema: 

ESCRITURA DO TEMPO

Um jeito singular de ver a vida.
Um encontro com a realidade.
Um manifesto, uma trajetória.
Um discorrer a própria história.
Uma palavra, um silêncio.
Além das palavras!
Um tempo, grande amigo.
Um mundo real, cinza fantasia.
Um presente, simbólico.
Uma existência, um destino.
Um espelho, um sonho.
Uma verdade, uma mentira.
Lucidez e luxúria.
Devaneios e heresia.
Uma loucura.
Um Sentimento
que atravessa a escritura.
Uma tentativa modesta
de num poema fazer poesia.
Mais uma vez, apenas uma leitura.

Neste Poema, Paulo Roberto dos Santos, poeta de Pará de Minas, faz afirmações que não são um fim em si mesmo. Veja que ele afirma "Uma palavra, um silêncio." e todas as demais afirmações são sempre "'um" e não "a", ou "o", ou seja são afirmações, mas não definições. São convites ao pensar... Convites a possibilidades!!! São "sentimento que atravessa a escritura". É a poesia livre a encontrar caminhos... 

É dessa liberdade que estou dizendo, não da liberdade poética do poeta, ou da liberdade do leitor-poeta a captar o poesia do poema, mas a liberdade da poesia de manifestar-se, de contaminar, a nos fertilizar e fazer germinar poesia...

Bibliografia

NILO, Pedro. Flauvertes fúgrubres aspirais. São Paulo: Atlântico Print, 2021, p. 19.
SANTOS, Paulo Roberto dos. Semblantes de um silêncio. Belo Horizonte: Toda Voz, 2022, p. 44.