sexta-feira, 17 de outubro de 2014

A IGREJINHA DA SERRA
Phonteboa
Fotografia: Adilson Nogueira

Datada de 1853, a Igrejinha da Serra, mais conhecida como Igrejinha do Bonfim, olhava de frente para a Capela do Rosário. Esta por sua vez, nesta quarta-feira à noite, assistiu desesperada sua irmã sendo devorada pelas chamas. Assistiu tudo passivamente, sem nada poder fazer. Afinal o que pode contra as chamas?!  O que pode contra o abandono vivido há anos, pelos ditos “fiéis” que lá frequentam.
Alguns acusam as autoridades pelo descaso e abandono do Patrimônio Público Cultural. Outros acusam o silêncio das autoridades públicas que não combatem os criminosos como deviam! Outros ainda reverberam profecias de que o que aconteceu era previsto, sendo resultado da realidade da crise moral e de valores que estamos vivendo, por que as pessoas não respeitam mais nada! Há aqueles que não conseguem dizer nada, apenas balbuciam palavras desconexas que expressam espanto, tristeza, lamentos... nada mais. Enquanto isso, lá está a Igrejinha da Serra com as marcas do fogo, com as cicatrizes interna dilaceradas...(reveja a fotografia) e do outro lado a Capela do Rosário prevendo o mesmo destino... e mais embaixo, bem no meio das duas a Estação Ferroviária gritando socorro, a Casa dos Engenheiros, a gruta, os casarões... Agora, depois das chamas ter consumido as entranhas de sua irmã, a Capela do Rosário assiste a população de Itaúna cabisbaixo, pleno de lamentos, entristecidos, lacrimosos, atônitos, pelo “desastre” ocorrido com a abandonada irmã. E o que dizer, então?! Que palavras pronunciar para o consolo desta gente? Como levantar o seu ânimo?! (ânimo da mesma rais que Alma) Silenciar e respeitar sua dor? O que assiste a Capela do Rosário?
Enquanto isso as autoridades, os representantes da sociedade que circulam em prantos e lamentos não sabem o que fazer. Esta comoção inicial certamente cessará. Alguns culparão outros, e outros, e outros... e tudo continuará como está. As ruínas da Capelinha da Serra agora se tornaram vozes, que junto com as ruínas do hospital velho, anunciará a todos o “amor” dos itaunenses com sua história... é só o que lhe resta. A Capela do Rosário, o Museu, a Gruta, o Casarão do Dr. Augusto, a casa dos Engenheiros, a Estação de Santanense, o Casarão dos Lima, e todos os outros Patrimônios Públicos Culturais continuarão a gritar por socorro... mas o povo surdo continuará não ouvindo.
Provavelmente serão apresentados projetos para reerguer a Capelinha da Serra, como há bandeiras para destruir as ruínas do hospital velho, pois a população não gosta de ver estampadas nestas velhas paredes a vergonha de ser um povo de uma “cidade educativa” que não cuida de si própria, que não se ama, que em nome do progresso e da fortuna de poucos, mata sua própria história e esquece quem são, que não quer ter identidade.
Provavelmente algumas autoridades serão acusadas pela população desta “cidade educativa”, esquecendo que Patrimônio Público Cultural não pertence a prefeitura, e nem a um proprietário específico, mas pertence à cidade, a todos e que todos tem a obrigação de dele cuidar. Que o Patrimônio Público Cultural de um povo, tem um proprietário, e que este proprietário deve ser o primeiro a procurar os meios de proteção deste bem público. Que o Patrimônio Público Cultural é público, não porque está sobre a gestão de um órgão público, mas porque tem sentido e significado para a coletividade. Que Patrimônio Público Cultural, embora tenha um proprietário e pertence a um indivíduo ou instituição, esta não pode dispor dele como bem entender, pois este bem exerce uma representatividade pública além de sua função pública específica. Assim a Capelinha da Serra não é responsabilidade somente da Paróquia que a administra, ou da Prefeitura, ou do Conselho do Patrimônio. Não a Capelinha da Serra é responsabilidade de todos. A Capelinha da Serra “era nossa”, agora suas “ruínas” são “nossas”, e “nós” temos que decidir o que fazer com “ela”, assim como temos que decidir o que fazer com as ruínas do hospital velho, com a Estação Ferroviária (nosso museu), com a Capela do Rosário, com a Gruta, com o Casarão do Dr. Augusto, com o Casarão dos Lima, com a Casa dos Engenheiros, com a Estação de Santanense, com a Casa da Antiga Secretaria de Educação, enfim, com o “Nosso Patrimônio Cultural”.

Sentar e chorar resolve? Talvez expressa a dor que estamos vivendo ou seja a forma que nós humanos temos para lidar com as perdas, mas a vida continua... Assim, este é o momento de nos mobilizarmos, de acordar para a nossa realidade, de exigir uma postura do poder público e dos proprietários dos móveis e imóveis que têm importância e significado para a nossa história e para a coletividade e ver o que precisa ser feito, decidir o que vai ser feito, antes que amanhã tenhamos novas lágrimas ao ver mais um casarão no chão, mais uma capela pegando fogo, ou uma estação vindo abaixo... o que podemos aprender com isso?!! Não tenho respostas prontas, mas é preciso seguir em frente, fechar as feridas e deixar que as cicatrizes contem nossas histórias. Não podemos esquecer, no entanto, que “quem sabe faz a hora não espera acontecer”.