domingo, 4 de outubro de 2015

A POESIA FILOSÓFICA DE MANOEL DE BARROS.



Manoel Wenceslau Leite de Barros, ou simplesmente Manoel de Barros foi um poeta nascido em Cuiabá (MT), no ano de 1916. Depois foi morar em Corumbá (MS) de lá foi para a cidade do Rio de Janeiro, onde cursou Direito. Em 1937 publicou o livro o “Poemas Concebidos Sem Pecado”. Em 1942 publicou o “Face Imóvel” e em 1946, “Poesias”. De volta a Mato Grosso do Sul, Campo Grande, passou a dedicar-se à administração de uma fazenda herdada de seu pai. Somente na década de 1980 é que ficou conhecido no mundo da poesia, quando então Millôr Fernandes publicou suas poesias em um jornal de grande circulação nacional.
Os temas de sua poesia é a natureza, mais especificamente a natureza do Pantanal. Seu estilo é bastante diversificado, mas é também senhor uma originalidade que sai da esfera convencional.  Ainda no ano de 1961 publicou “Compêndio para Uso dos Pássaros”, depois, em 1969  “Gramática Expositiva do Chão”, em 1974, “Matéria de Poesia”. Na década de 1980 saiu “O Guardador de Águas”. Já o “Retrato do Artista Quando Coisa” e dos anos de 1990, “O Fazedor de Amanhecer” é de 2001, dentre outras obras.
Em uma das entrevistas em que fala da poesia, ele afirmava que poesia para ele não era uma inspiração, mas sim uma transpiração. Depois de tanto transpirar, no seu esforço contínuo de apresentar o inusitado pela poesia, Manoel de Barros fechou os olhos eternamente no dia 13 de novembro de 2014.
Alguns analistas e críticas de literatura consideram Manoel de Barros o João Guimarães Rosa do Pantanal, isso por que sua genialidade de criar novos termos para dizer, de forma inusitada o que vê, o que sente e o que pensa tem algumas características parecidas com o grande escritor mineiro. Outros analistas o consideram um poeta-filósofo, isso por que sua poesia provoca uma nova forma olhar para as coisas do mundo. Desde as coisas mais simples até as coisas mais complexas.
Diante desta perspectiva podemos considerar alguns aspectos da poesia de Manoel de Barros, no sentido de exemplificar, como a sua produção poética se aproxima da reflexão filosófica. Manoel de Barros, ao produzir seus textos poéticos se utiliza de um processo de contemplação, mas que também é de transpiração que lhe obriga ver e considerar os detalhes da natureza, promove um movimento em que a poesia vivencia cada mínimo detalhe na busca expressiva de uma desertificação do próprio eu. Este esforço poético de Manoel de Barros que pode ser lido, prazerosamente, no poema abaixo, é expressão deste novo refletir poético do “admirar” o mundo, princípio do fazer filosófico, e, ao mesmo tempo, busca de compreensão do próprio eu.
Percorro todas as tardes um quarteirão de paredes nuas.
Nuas e sujas de idade e ventos.
Vejo muitos rascunhos de pernas de grilos pregados nas pedras.
As pedras, entretanto, são mais favoráveis a pernas de moscas do que de grilos.
Pequenos caracóis deixaram suas casas pregadas nestas pedras
e as suas lesmas saíram por aí à procura de outras paredes.
Asas misgalhadinhas de borboletas tingem de azul estas pedras.
Uma espécie de gosto por tais miudezas me paralisa.
Caminho todas as tardes por estes quarteirões desertos, é certo.
Mas nunca tenho certeza se estou percorrendo o quarteirão deserto
Ou algum deserto em mim. (BARROS, 2005:31)
Nesta odisseia poética, Manoel de Barros estabelece uma nova didática do olhar e nesta vai revelando os detalhes insignificantes que o homem contemporâneo não consegue mais ver. Assim, o poeta revela, a contramão do tempo acelerado da vida moderna, o caminhar dos caramujos – “Há um comportamento de eternidade nos caramujos para subir os barrancos de um rio, eles percorrem um dia inteiro até chegar a manhã” (BARROS, 2005, p. 319); ou a busca do silêncio num mundo pleno de barulho – “(…) Uso a palavra para compor meus silêncios. Não gosto das palavras fatigadas de informar” (BARROS, 2003, p. 39); ou ainda a busca de valorização do que é insignificante, do descartável – “ ... as coisas que não tem dimensões são muito importantes. (…) É no ínfimo que eu vejo exuberância” (BARROS, 2005, p.55).
Os exemplos aqui apresentados de Manoel de Barros são suficientes para perceber como o poeta, utilizando-se da linguagem própria da poesia, traz um novo “admirar”, provocando um certo desconforto com a realidade que o certa, e ainda possibilita um novo olhar para aquilo que há muito já foi visto, mas que, por inúmeros contratempos, perdeu seu sentido. O Poeta (Manoel de Barros) mesmo sem ser filósofo age como filósofo no “estranhamento” do mundo, propõe novos olhares e provocam novos posicionamento diante do que é comum ou cotidiano. Sua poesia é belíssima, mas cada verso é denso, intenso e pleno de filosofia que só filósofos e poetas (como uma criança) podem compreender. Assim, temos o filósofo-poeta (Nietzsche) e o poeta-filósofo (Manoel de Barros) no esforço de compreender o mundo e a sua realidade, usando tão somente a linguagem, e em última instância, a palavra, no exercício de expressar o que vê, quer pelos sentidos, quer pelos sentimentos.

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