A IGREJINHA DA SERRA
Phonteboa
Fotografia: Adilson Nogueira
Datada de 1853, a Igrejinha da Serra, mais conhecida como
Igrejinha do Bonfim, olhava de frente para a Capela do Rosário. Esta por sua
vez, nesta quarta-feira à noite, assistiu desesperada sua irmã sendo devorada
pelas chamas. Assistiu tudo passivamente, sem nada poder fazer. Afinal o que
pode contra as chamas?! O que pode
contra o abandono vivido há anos, pelos ditos “fiéis” que lá frequentam.
Alguns acusam as autoridades
pelo descaso e abandono do Patrimônio Público Cultural. Outros acusam o
silêncio das autoridades públicas que não combatem os criminosos como deviam!
Outros ainda reverberam profecias de que o que aconteceu era previsto, sendo
resultado da realidade da crise moral e de valores que estamos vivendo, por que
as pessoas não respeitam mais nada! Há aqueles que não conseguem dizer nada,
apenas balbuciam palavras desconexas que expressam espanto, tristeza,
lamentos... nada mais. Enquanto isso, lá está a Igrejinha da Serra com as marcas
do fogo, com as cicatrizes interna dilaceradas...(reveja a fotografia) e do
outro lado a Capela do Rosário prevendo o mesmo destino... e mais embaixo, bem
no meio das duas a Estação Ferroviária gritando socorro, a Casa dos
Engenheiros, a gruta, os casarões...
Agora, depois das chamas ter consumido as entranhas de sua
irmã, a Capela do Rosário assiste a população de Itaúna cabisbaixo, pleno de
lamentos, entristecidos, lacrimosos, atônitos, pelo “desastre” ocorrido com a
abandonada irmã. E o que dizer, então?! Que palavras pronunciar para o consolo
desta gente? Como levantar o seu ânimo?! (ânimo da mesma rais que Alma) Silenciar
e respeitar sua dor? O que assiste a Capela do Rosário?
Enquanto isso as autoridades, os
representantes da sociedade que circulam em prantos e lamentos não sabem o que
fazer. Esta comoção inicial certamente cessará. Alguns culparão outros, e
outros, e outros... e tudo continuará como está. As ruínas da Capelinha da
Serra agora se tornaram vozes, que junto com as ruínas do hospital velho,
anunciará a todos o “amor” dos itaunenses com sua história... é só o que lhe
resta. A Capela do Rosário, o Museu, a Gruta, o Casarão do Dr. Augusto, a casa
dos Engenheiros, a Estação de Santanense, o Casarão dos Lima, e todos os outros
Patrimônios Públicos Culturais continuarão a gritar por socorro... mas o povo
surdo continuará não ouvindo.
Provavelmente serão apresentados
projetos para reerguer a Capelinha da Serra, como há bandeiras para destruir as
ruínas do hospital velho, pois a população não gosta de ver estampadas nestas
velhas paredes a vergonha de ser um povo de uma “cidade educativa” que não cuida
de si própria, que não se ama, que em nome do progresso e da fortuna de poucos,
mata sua própria história e esquece quem são, que não quer ter identidade.
Provavelmente algumas
autoridades serão acusadas pela população desta “cidade educativa”, esquecendo
que Patrimônio Público Cultural não pertence a prefeitura, e nem a um
proprietário específico, mas pertence à cidade, a todos e que todos tem a
obrigação de dele cuidar. Que o Patrimônio Público Cultural de um povo, tem um
proprietário, e que este proprietário deve ser o primeiro a procurar os meios
de proteção deste bem público. Que o Patrimônio Público Cultural é público, não
porque está sobre a gestão de um órgão público, mas porque tem sentido e
significado para a coletividade. Que Patrimônio Público Cultural, embora tenha
um proprietário e pertence a um indivíduo ou instituição, esta não pode dispor
dele como bem entender, pois este bem exerce uma representatividade pública
além de sua função pública específica. Assim a Capelinha da Serra não é
responsabilidade somente da Paróquia que a administra, ou da Prefeitura, ou do
Conselho do Patrimônio. Não a Capelinha da Serra é responsabilidade de todos. A
Capelinha da Serra “era nossa”, agora suas “ruínas” são “nossas”, e “nós” temos
que decidir o que fazer com “ela”, assim como temos que decidir o que fazer com
as ruínas do hospital velho, com a Estação Ferroviária (nosso museu), com a
Capela do Rosário, com a Gruta, com o Casarão do Dr. Augusto, com o Casarão dos
Lima, com a Casa dos Engenheiros, com a Estação de Santanense, com a Casa da
Antiga Secretaria de Educação, enfim, com o “Nosso Patrimônio Cultural”.
Sentar e chorar resolve? Talvez
expressa a dor que estamos vivendo ou seja a forma que nós humanos temos para
lidar com as perdas, mas a vida continua... Assim, este é o momento de nos
mobilizarmos, de acordar para a nossa realidade, de exigir uma postura do poder
público e dos proprietários dos móveis e imóveis que têm importância e
significado para a nossa história e para a coletividade e ver o que precisa ser
feito, decidir o que vai ser feito, antes que amanhã tenhamos novas lágrimas ao
ver mais um casarão no chão, mais uma capela pegando fogo, ou uma estação vindo
abaixo... o que podemos aprender com isso?!! Não tenho respostas prontas, mas é
preciso seguir em frente, fechar as feridas e deixar que as cicatrizes contem
nossas histórias. Não podemos esquecer, no entanto, que “quem sabe faz a hora
não espera acontecer”.
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